A Espada - DJ Blog

A Espada

Publicado em sábado, 24 de setembro de 2011



Uma família de classe média alta. Pai, mulher, um filho de sete anos. É a noite do dia em que o filho fez sete anos.
A mãe recolhe os detritos da festa. O pai ajuda o filho a guardar os presentes que ganhou dos amigos. Nota que o filho está quieto e sério, mas pensa: “É o cansaço.” Afinal ele passou o dia correndo de um lado para o outro, comendo cachorro-quente e sorvete, brincando com os convidados por dentro e por fora da casa. Tem que estar cansado.
- Quanto presente, hein, filho?
- É.
- E esta espada. Mas que beleza. Esta eu não tinha visto.
– Pai…
- E como pesa! Parece uma espada de verdade. É de metal mesmo. Quem foi que deu?
- Era sobre isso que eu queria falar com você.
O pai estranha a seriedade do filho. Nunca o viu assim. Nunca viu nenhum garoto de sete anos sério assim. Solene assim. Coisa estranha…
O filho tira a espada da mão do pai. Diz:
- Pai, eu sou Thunder Boy.
- Thunder Boy?
- Garoto Trovão.
- Muito bem, meu filho. Agora vamos pra cama.
- Espere. Esta espada. Estava escrito. Eu a receberia quando fizesse sete anos.
O pai se controla para não rir. Pelo menos a leitura de história em quadrinhos está ajudando a gramática do guri. “Eu a receberia…”
O guri continua. - Hoje ela veio. É um sinal. Devo assumir meu destino. A espada passa a um novo Thunder Boy a cada geração. Tem sido assim desde que ela caiu do céu, no vale sagrado de Bem Tael, há sete mil anos, e foi empunhada por Ramil, o primeiro Garoto Trovão.
O pai está impressionado. Não reconhece a voz do filho. E a gravidade do olhar. Está decidido. Vai cortar as histórias em quadrinhos por uns tempos.
- Certo, filho. Mas agora vamos…
- Vou ter que sair de casa. Quero que você explique à mamãe. Vai ser duro para ela. Conto com você para apoiá-la. Diga que estava escrito. Era o meu destino.
- Nós nunca mais vamos ver você?
– pergunta o pai, resolvendo entrar no jogo do filho enquanto o encaminha, sutilmente, para a cama.
- Claro que sim. A espada do Thunder Boy está a serviço do bem e da justiça. Enquanto vocês forem pessoas boas e justas poderão contar com a minha ajuda.
- Ainda bem – diz o pai. E não diz mais nada.
Porque ve o filho dirigir-se para a janela do seu quarto, e erguer a espada como uma cruz, e gritar para os céus “Ramil!”.
E ouve um trovão que faz estremecer a casa. E vê a espada iluminar-se e ficar azul. E o seu filho também.
O pai encontra a mulher na sala. Ela diz:
- Viu só? Trovoada. Vá entender este tempo.
- Quem foi que deu a espada pra ele?
- Não foi você? Pensei que tivesse sido você.
- Tenho uma coisa pra te contar
- O que é?
- Senta, primeiro.

Luís Fernando Veríssimo.

6 comentários:

Unknown disse...

Bom fim de semana pra vc querida!
bjsss

Luciana disse...

oi

retribuindo a visita

bjs

Adriana Alencar disse...

É bem divertida, gostei!
Bj
Adri

Bruna disse...

Ainda não tinha lido esse texto do Veríssimo!!
Beijos

Deyse Joyce disse...

Achei uma graça essa crônica!!!

Bjins

Evandro Pezzi disse...

Adoro as crônicas dele!!

Beijinhos

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