Uma família de classe média alta. Pai, mulher, um filho de sete anos. É a noite do dia em que o filho fez sete anos.
A mãe recolhe os detritos da festa. O pai ajuda o filho a guardar os presentes que ganhou dos amigos. Nota que o filho está quieto e sério, mas pensa: “É o cansaço.” Afinal ele passou o dia correndo de um lado para o outro, comendo cachorro-quente e sorvete, brincando com os convidados por dentro e por fora da casa. Tem que estar cansado.
- Quanto presente, hein, filho?
- É.
- E esta espada. Mas que beleza. Esta eu não tinha visto.
– Pai…
- E como pesa! Parece uma espada de verdade. É de metal mesmo. Quem foi que deu?
- Era sobre isso que eu queria falar com você.
O pai estranha a seriedade do filho. Nunca o viu assim. Nunca viu nenhum garoto de sete anos sério assim. Solene assim. Coisa estranha…
O filho tira a espada da mão do pai. Diz:
- Pai, eu sou Thunder Boy.
- Thunder Boy?
- Garoto Trovão.
- Muito bem, meu filho. Agora vamos pra cama.
- Espere. Esta espada. Estava escrito. Eu a receberia quando fizesse sete anos.
O pai se controla para não rir. Pelo menos a leitura de história em quadrinhos está ajudando a gramática do guri. “Eu a receberia…”
O guri continua. - Hoje ela veio. É um sinal. Devo assumir meu destino. A espada passa a um novo Thunder Boy a cada geração. Tem sido assim desde que ela caiu do céu, no vale sagrado de Bem Tael, há sete mil anos, e foi empunhada por Ramil, o primeiro Garoto Trovão.
O pai está impressionado. Não reconhece a voz do filho. E a gravidade do olhar. Está decidido. Vai cortar as histórias em quadrinhos por uns tempos.
- Certo, filho. Mas agora vamos…
- Vou ter que sair de casa. Quero que você explique à mamãe. Vai ser duro para ela. Conto com você para apoiá-la. Diga que estava escrito. Era o meu destino.
- Nós nunca mais vamos ver você?
– pergunta o pai, resolvendo entrar no jogo do filho enquanto o encaminha, sutilmente, para a cama.
- Claro que sim. A espada do Thunder Boy está a serviço do bem e da justiça. Enquanto vocês forem pessoas boas e justas poderão contar com a minha ajuda.
- Ainda bem – diz o pai. E não diz mais nada.
Porque ve o filho dirigir-se para a janela do seu quarto, e erguer a espada como uma cruz, e gritar para os céus “Ramil!”.
E ouve um trovão que faz estremecer a casa. E vê a espada iluminar-se e ficar azul. E o seu filho também.
O pai encontra a mulher na sala. Ela diz:
- Viu só? Trovoada. Vá entender este tempo.
- Quem foi que deu a espada pra ele?
- Não foi você? Pensei que tivesse sido você.
- Tenho uma coisa pra te contar
- O que é?
- Senta, primeiro.
Luís Fernando Veríssimo.
6 comentários:
Bom fim de semana pra vc querida!
bjsss
oi
retribuindo a visita
bjs
É bem divertida, gostei!
Bj
Adri
Ainda não tinha lido esse texto do Veríssimo!!
Beijos
Achei uma graça essa crônica!!!
Bjins
Adoro as crônicas dele!!
Beijinhos
nandapezzi.blogspot.com
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