Ninguém cavalgou Pégaso com mais virilidade e destreza do que Belerofonte, um jovem e valente guerreiro que ousou enfrentar com ele uma temível criatura chamada Quimera.
Tendo vivido durante algum tempo sob a proteção do rei Proeto, Belerofonte acabou por se envolver involuntariamente com a esposa deste, a bela e sedutora Antéia.
— Belo jovem, deixe-me amá-lo — dizia a toda hora a insistente rainha. Belerofonte, no entanto, temendo um atrito com o rei, fugia o tempo todo.
Antéia, vendo que suas investidas não davam em nada, decidiu punir o seu objeto de
desejo.
— Pagará caro por me rejeitar — disse a rainha, um dia, farta de se oferecer em vão.
E tratou de intrigar o jovem com seu desavisado esposo:
— Proeto, querido, esse rapaz é muito abusado...
— Abusado? O que está dizendo, querida? — disse o rei, intrigado.
— Esse insolente não tem feito outra coisa desde que chegou ao nosso reino senão me cercar com propostas indecentes — disse a rainha, fingindo indignação.
O rei, sentindo-se ultrajado com tamanha afronta, decidiu enviar o ex-protegido à corte de seu sogro, na Lídia. Junto, remeteu uma carta, na qual pedia que ele se encarregasse de dar um fim a Belerofonte.
Lobates — tal era o nome do rei da Lídia -, a princípio, ficou aborrecido ao receber a
incumbência. "Por Zeus! Genros só trazem problemas!", resmungou, e foi receber o jovem visitante com mostras de simpatia.
Durante muito tempo Lobates imaginou um meio de acabar com Belerofonte sem que
isso acarretasse problemas para si, até que um dia chegou a notícia de que a Quimera — um monstro terrível que assolava seu reino — havia feito mais uma vítima.
— É isto! — exclamou o monarca, dando uma palmada na testa e mandando chamar
imediatamente o rapaz.
— Belerofonte, somente você, montado em seu cavalo alado, poderá fazer frente à
horrível criatura que vem há tanto tempo aterrorizando o meu reino! -disse ao herói.
— Mas que monstro é este que vocês chamam de Quimera?
— É uma besta que expele chamas pela boca e pelo nariz. Seu corpo é uma mistura
grotesca de vários seres: tem cabeça de leão, corpo de cabra e sua parte posterior é em tudo idêntica à de um dragão.
Belerofonte — que ficara mais intrigado do que assustado com a descrição da estranha
criatura — dispôs-se imediatamente a partir com seu cavalo alado, a fim de retribuir a acolhida que tivera do rei.
Na ampla estrebaria do palácio estava acomodado Pégaso, o cavalo que Belerofonte havia domado graças ao freio dourado que Atena lhe havia dado durante um sonho. Ao enxergar o dono por entre as frestas da madeira, o animal começou a relinchar suave e melodicamente, muito diferente dos outros cavalos.
Tão logo Pégaso viu-se livre de sua prisão temporária, começou a voar em círculos emtorno de Belerofonte, que tentava inutilmente lhe alcançar as rédeas douradas.
— Por favor, Pégaso, deixe de brincadeiras!
O cavalo, descendo das nuvens, foi pousar aos pés do herói, curvando docilmente a
cabeça, enquanto Belerofonte, num salto ágil, montou sobre o seu dorso.
— Vamos embora, pois temos uma missão a cumprir! — disse o cavaleiro, afrouxando as rédeas do maravilhoso cavalo, que se lançou ao espaço num galope veloz.
Belerofonte cruzou os céus, sentindo um pouco do prazer que um dia também sentira,
ainda que de maneira diferente e fugaz, o infeliz Ícaro das asas de cera.
O herói estava entregue aos seus pensamentos quando divisou, afinal, a temível fera, que o observava expelindo fogo pela boca. Cercada por montanhas, a Quimera escalou rapidamente a encosta de uma delas; Pégaso, abrindo bem as asas, voejava em torno da presa, na tentativa de torná-la um alvo fácil para os dardos afiados de Belerofonte. Mas a fera sumiu, abruptamente, ocultando-se numa das inúmeras grutas.
— Se tiver de procurá-la de caverna em caverna, estarei bem arranjado -exclamou o
guerreiro, aborrecido.
O cavalo alado pousou sobre o solo acidentado. Grandes pedras espalhadas por todo o
lado dificultavam os passos do animal.
— Pégaso, fique aqui, enquanto vou verificar — disse Belerofonte ao animal.
Desmontando, Belerofonte entrou numa das grutas. De dentro escapava-se um calor suspeito, que fazia crer que a fera houvesse buscado ali um refúgio. Enquanto o herói avançava cada vez mais para dentro da caverna, escutou um relincho agudo de seu cavalo.
— Silêncio, Pégaso, não me tire a concentração! — disse Belerofonte, fazendo um gesto com a mão, sem voltar os olhos para o cavalo.
Pégaso, no entanto, prosseguia no seu relincho de alerta, pois de outra entrada lateral o monstro seguia os passos do destemido guerreiro.
Erguendo vôo, o cavalo alado veio pelas costas da Quimera e a acertou com um golpe
dos cascos, lançando-a ao chão e despertando a atenção do seu dono.
— Vencemos!
Após derrotar o flagelo do reino, Belerofonte e Pégaso retornaram para a corte. O rei
Lobates, vendo que nada conseguira ao expor o visitante à mais terrível das feras, resolveu envolvê-lo numa guerra com as amazonas, na vã esperança de ver sua ruína.
Apesar de toda a fúria e combatividade das cavaleiras, não foram elas páreo, tampouco, para a força e a coragem do herói grego, que as derrotou sem maiores dificuldades. O rei, então, vendo que seus artifícios jamais poriam fim à vida do herói — e agradado já, a esta altura, do valor do guerreiro —, decidiu fazer dele o marido de sua filha.
— Meu genro que se dane... — disse ele à sua esposa, que estava, também, encantada
com as qualidades de Belerofonte.
— Ele é realmente fantástico! — concordou ela, num enlevo.
A princesa Filonoé, perfeitamente de acordo com a idéia, pediu logo a seu pai que
marcasse para o mais breve possível a data do seu casamento. Belerofonte e sua nova esposa viveram felizes durante algum tempo, até que o herói, sentindo-se envaidecido com tamanhos triunfos, acabou por cair no erro fatal da soberba.
Tomando um dia as rédeas de seu cavalo alado, disse baixinho ao ouvido do seu cavalo de estimação:
— Venha, vamos conhecer a morada dos deuses!
Pégaso, diante da ordem, pela primeira vez na vida refugou; suas asas permaneciam
comprimidas enquanto seus dentes mastigavam relutantemente o freio.
— Vamos, garoto, o que foi?
O cavalo, a contragosto, distendeu as asas e lançou-se ao espaço. Belerofonte, montado em seu dorso, não via a hora de ver-se entre os deuses — pois ele próprio já se considerava um deles. "Por que razão não terei direito também à imortalidade, como tantos outros heróis?", pensava, enquanto as nuvens rasgavam-se diante de seus olhos.
Passando muito além do sol, Belerofonte começou a divisar uma luz muito mais
ofuscante que a do poderoso astro.
— Estamos chegando, Pégaso!
Zeus, porém, sabedor da audácia do herói de invadir os seus domínios, já havia tomado providências. Metamorfoseando-se numa mosca, começou a atormentar Pégaso, picando seus flancos sem descanso, até que ele começou a corcovear, derrubando, por fim, Belerofonte.
O herói escapou milagrosamente da morte, mas acabou tornando-se coxo e miserável, vivendo como um mendigo o resto da sua vida.
Imagem: Reprodução.
Texto: as 100 melhores histórias da mitologia grega.
2 comentários:
arrasou. mitologia é demais né?
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Nathália • Fashion Jacket
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Adoro quando você separa textos tão bacanas de mitologia e começar o ano com este, é bom demais, amiga!
Bjos bjos
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